Por certo, não há que se falar na existência de uma melhor defesa ou tese defensiva para uma denúncia de lavagem de dinheiro. A melhor defesa/tese vai depender da análise pormenorizada do caso em concreto.
Quero tratar neste artigo, da tese do exaurimento do crime anterior. Uma boa tese defensiva para a imputação de crime de lavagem de dinheiro, que ganhou fama no caso do mensalão – ação penal nº 470 do STF.
O delito de lavagem de dinheiro exige haja um crime anterior. Não é possível lavar dinheiro advindo de origem lícita, por isso se exige tenha ocorrido infração penal anterior.
O delito de lavagem de dinheiro foi pensado para melhor punir o crime de tráfico, por isso, no início, na chamada primeira geração, só era possível falar de lavagem quando havia o delito anterior de tráfico. O Brasil, em 3 de março de 1998, trouxe a criminalização da lavagem de dinheiro, já aderindo à segunda geração, incluiu outros delitos além do tráfico de drogas capazes de gerar o delito de lavagem de dinheiro. Havia um rol taxativo de crimes que poderiam ensejar a lavagem de dinheiro.
Em 9 de julho de 2012, o Brasil aderiu à terceira geração da política crimnal de combate à lavagem de dinheiro, legislando que qualquer infração penal, note-se todos os crime e contravenções penais, pode ser objeto anterior da lavagem de dinheiro.
Com isso, muitos crimes acabam se confundindo com o ocultar ou dissimular valores do tipo do artigo 1º da Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei nº 9.613/98). Muitas vezes não é simples separar um crime do outro. Situação ainda mais difícil com a total ampliação dos possíveis crimes antecedentes. É aí que reside bom momento defensivo para denúncia por lavagem de dinheiro.
Quando a ocultação estiver contida entre os elementos do crime antecedente, este ato posterior estará absorvido pelo delito antecedente. Trata-se apenas do crime antecedente, não de um delito autônomo de lavagem de dinheiro. É uma tese complexa, geradora de grandes debates nos tribunais, mas é, ao certo, tese defensiva muito efetiva quando bem demonstrada.
Não é qualquer ocultação de valor que é apta a ensejar a lavagem de dinheiro. Fosse assim quase todos os crimes patrimoniais não escapariam desa caracterização. Evidente que o agente vai tentar esconder o produto do crime de roubo, de furto, de estelionato, etc. A ocultação somente poderá caracterizar lavagem de dinheiro se for um passo inicial de uma posterior reinserção desses valores na economia formal. Somado a isso, deve haver a intenção de dar aparência de licitude destes valores, ou seja, simulando que aqueles valores foram obtidos licitamente.
Afora isso, a melhor doutrina aponta que o mero usufruir do produto do crime anterior não pode ser caracterizado como lavagem de dinheiro, mas o exaurimento do delito anterior. Se alguem furta valores, inafastavelmente pretende gastá-lo.
CASO DO MENSALÃO
No caso do mensalão, Ação Penal nº 470, a denúncia descreveu que alguns dos réus solicitaram ou receberam, em razão da sua função, vantagem indevida, capitulando assim a corrupção passiva (art. 317 do CP) – crime anterior. Continuou a denúncia narrando que o pagamento de tais valores teria sido feito em dinheiro em espécie e entregue para terceiras pessoas, assessores e parentes próximos, que, então repassaram este capital aos verdadeiros destinatários, os agentes públicos denunciados, denunciando por lavagem de dinheiro (art. 1º, da Lei 9.613/98).
Para o Ministério Público o recebimento de valores por terceiras pessoas foi ato de ocultação, já caracterizarizando a lavagem de dinheiro.
Ocorre que assim dispõe o tipo penal de corrupção passiva:
Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
No caso tratado, os agentes receberam os valores por terceiras pessoas. Note-se que receber o valor é o término do iter criminis (percuso do crime) de corrupção passiva narado na denúncia.
Note-se como a discussão é complexa.
Este é o ponto fulcral da tese do exaurimento do delito anterior. O advogado defender, assim feito com brilhantismo pelos advogados do mensalão, que a lavagem de dinheiro só se aplica aos atos posteriores à consumação do delito antecedente. Deve bem separar as infrações, argumentando que não pode ocorrer o delito de lavagem quando o delito anterior ainda não se perfectibilizou. Se receber dinheiro por assessores e parentes foi o fim do delito de corrupção passiva, não pode este mesmo receber valores ser considerado lavagem de dinheiro.
Ao certo, o simples recebimento de numerário por interposta pessoa não tipifica lavagem de dinheiro. Vale lembrar que quase nunca a vantagem indevida é recebida diretamente pelo agente infrator da corrupção passiva. O uso de intermediários é uma modalidade de consumação, não infração adicional, principalmente quando o terceiro é próximo do réu.
SERIA DIFERENTE
Lavar dinheiro é retirar as manchas e a ligação com o crime antecedente.
Nem sempre a simples ocultação e recebimento por interposta pessoa são capazes disso.
Efeito diverso teríamos no caso do agente enterrar o dinheiro e solicitasse a doleiro providências para uma transação por dólar-cabo, com a disponibilização da mesma soma em moeda estrangeira. Assim, além da ocultação, existiria contexto de reciclagem. Existiria aptidão para apagar os rastros do capital ilícito, desvinculando do passado obscuro daquele dinheiro.
CONCLUÍNDO
Não existe uma tese defensiva perfeita e pronta para denúncias de lavagem de dinheiro. A melhor defesa vai depender da análise pormenorizada do caso concreto e de todas suas nuances. Como tratado no texto, uma boa saída defensiva pode ser sustentar que a imputação da lavagem da denúncia é o exaurimento do delito anterior, conforme bem trabalhado no caso do Mensalão.
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